«o que me excita a escrever é o desejo de me esclarecer na posse disto que conto, o desejo de perseguir o alarme que me violentou e ver-me através dele e vê-lo de novo em mim, revelá-lo na própria posse, que é recuperá-lo pela evidência da arte. Escrevo para ser, escrevo para segurar nas minhas mãos inábeis o que fulgurou e morreu.»

Vergílio Ferreira, Aparição

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quinta-feira, 15 de julho de 2010

.......................................dias que passam e nada muda.
................vezes e vezes sem conta a mesma desilusão.
.de orgulho, sempre pouco.
......................de compreensão, quase nada.
.......................................perco-me da essência deste quase nada.
..............escassa esperança que me custa alimentar.
................................ela não morre, porém.
......morresse antes, e tudo seria apenas o mórbido silêncio do arrependimento.
A noite. Longa. Silenciosa. No gemido de uma acutilante calma jaz o grito do ipiranga de um ser que se vê no espelho como um belo adormecido. Ele é calmo, é cortês, é bem parecido. É inteligente, sorri com todo o encanto da simpatia e é, profissionalmente, bem conseguido. Tem-se a si como um promissor investimento, mas é ainda inóquo. Juram-lhe que tudo renderá, que a espera renderá. Mas na pressa de um retorno, na insatisfação da vigia, os juros não rendem, Ainda.
(é com pontos - finais ou interlocutórios - que dá de si, a si, essa pausa.)
Cada ponto é ainda uma espera. E com cada ponto ele espera pôr toda a impaciência em espera. Mais: ele espera vencer-se, não de cansaço, mas de paz. É o que lhe apraz e pronto. .r.... Que se engane, ainda. .r.... Que se iluda, já. .r.... Pudera ele esvair-se na noite como um som que ninguém escuta nos seus sonos e nenhuma inepta insónia traria de volta ao mundo o ser que seria tão-somente o ruído sem sombra nem bagagem de uma noite fresca. E esse ruído seria, na humilde pequenez do desconhecimento do mundo, um fim em si mesmo. E os outros sons, os que ecoam nalgum campo de squash craniano que ele quis esquecer de revisitar, sem sucesso, seriam apenas o pó que uns sacodem da capota e que outros comem porque nada mais lhes pára na boca. É do sonho, o que ameaça chegar mas que .r...., sempre pode virar pesadelo, que ele tem medo. Não que o afaste das terras-do-nunca (do nunca mais é real, diria), porque ele é no sonho. É no sonho que ele se encontra e que ele se constrói.
Ele é um sonhador, e sonha tão completamente que até sonha que é dor, a dor que deveras sente.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Tu?

Estou preso a uma ideia, a um fantasma que não se corporiza. Quero soltar-me deste desejo que me consome por não cumprido, que se força à realização e que se quebra num caco. Que, em desespero, me quebra. Em desespero espero, ainda como sempre, esperando não mais esperar. E na espera, há um vulto, vestido de ti, que me acena do longínquo amanhã, incerto.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

(h)ora(s) (que) são

horas que nascem, horas que morrem, horas que passam. hora das coisas que cansam, ora das coisas que doem, hora das coisas que matam.
ora aqui, ora ali, ora acoli, ora acolá. ora, nesta hora ele ora, ora agora, ora já.
ora ainda, ainda é hora. hora após hora, ora, ele ora.
ora a toda hora, ora chora, ora ora para não chorar mais agora. ora são, ora triste, e neste momento resiste à hora de agora e por ora ele ora, sem demora.