«o que me excita a escrever é o desejo de me esclarecer na posse disto que conto, o desejo de perseguir o alarme que me violentou e ver-me através dele e vê-lo de novo em mim, revelá-lo na própria posse, que é recuperá-lo pela evidência da arte. Escrevo para ser, escrevo para segurar nas minhas mãos inábeis o que fulgurou e morreu.»

Vergílio Ferreira, Aparição

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segunda-feira, 30 de junho de 2008

Verde-desespero

Criou raízes no medo e não soube como fugir enquanto uma paz podre se apoderava de si. A paz que é o aceitar contestativo. A negra espera que vive até ao verificar da não concretização de vãs esperanças. No meio de tudo isto foi árvore, árvore seca cujo rigor do Inverno sombrio e do Verão escaldante não deixaram gerar frutos. Há coisas que já não teme: sabe que nunca será cortada para lenha, porque a sua madeira, carcomida pelos bichos do horror que é a certeza do amanhã imóvel, não terá proveito. Espera tombar. Entretanto os pássaros cantam, lá longe, não sabendo que a fome de uma manhã maravilhosa os consumirá. Num futuro não distante a manhã não chegará para eles, e o tronco estéril ainda estará lá.

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