«o que me excita a escrever é o desejo de me esclarecer na posse disto que conto, o desejo de perseguir o alarme que me violentou e ver-me através dele e vê-lo de novo em mim, revelá-lo na própria posse, que é recuperá-lo pela evidência da arte. Escrevo para ser, escrevo para segurar nas minhas mãos inábeis o que fulgurou e morreu.»

Vergílio Ferreira, Aparição

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segunda-feira, 30 de junho de 2008

Verde-desespero

Criou raízes no medo e não soube como fugir enquanto uma paz podre se apoderava de si. A paz que é o aceitar contestativo. A negra espera que vive até ao verificar da não concretização de vãs esperanças. No meio de tudo isto foi árvore, árvore seca cujo rigor do Inverno sombrio e do Verão escaldante não deixaram gerar frutos. Há coisas que já não teme: sabe que nunca será cortada para lenha, porque a sua madeira, carcomida pelos bichos do horror que é a certeza do amanhã imóvel, não terá proveito. Espera tombar. Entretanto os pássaros cantam, lá longe, não sabendo que a fome de uma manhã maravilhosa os consumirá. Num futuro não distante a manhã não chegará para eles, e o tronco estéril ainda estará lá.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Cansaço

O vento fustigando as memórias de quem já não espera por não que o túmulo que é a sua cama.
Correr os olhos pelas páginas, virá-las e saber-se que o céu limpo chama pelo mar, chama pelo campo, chamando sempre para longe da sala onde uma lâmpada aponta para montanhas de conhecimento que uma mente ignorante procura (re)conhecer. Aí, onde labirintos de tinta confundem olhos já habituados a estas maratonas, no repúdio da monotonia pede-se por mais (mais de diferente).
Ao deitar o corpo sobre o colchão não há como entortar o Direito e nem Faulkner consegue afastar o turbilhão de ideias (idiotices?) que por aqui crescem como ervas daninhas, sem que consiga envenená-las com uma qualquer humana banalidade.