«o que me excita a escrever é o desejo de me esclarecer na posse disto que conto, o desejo de perseguir o alarme que me violentou e ver-me através dele e vê-lo de novo em mim, revelá-lo na própria posse, que é recuperá-lo pela evidência da arte. Escrevo para ser, escrevo para segurar nas minhas mãos inábeis o que fulgurou e morreu.»

Vergílio Ferreira, Aparição

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quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Talvez um dia...

Talvez um dia eu passe a gostar mais do meu trabalho. Talvez um dia eu bata com a porta. Talvez um dia eu pegue numa mochila e parta sabe Deus para onde, para me descobrir. Talvez um dia eu deixe de ser (mais uma) engrenagem das máquinas do capitalismo e me dedique a causas em que acredite. Talvez um dia eu te vá procurar e deixe de esperar que me caias do céu. Talvez um dia a chuva caia e a minha preocupação não seja o trânsito. Talvez um dia eu deixe de ser um desarrumado mental. Talvez um dia eu saiba o que quero. Talvez um dia eu faça o que quero. Talvez um dia arrisque e aja despreocupadamente com a X, a Y, a Z e demais pessoas necessárias revelando interesse (talvez assim te encontre). Talvez um dia diga à minha mãe o quanto gosto dela. Talvez um dia diga ao meu pai o quanto o respeito. Talvez um dia diga aos meus irmãos tudo o que me ajudaria ter ouvido. Talvez um dia eu diga a certas pessoas para irem à fava. Talvez um dia eu faça longos pedidos de desculpas. Talvez um dia eu me esqueça do que é um computador. Talvez um dia eu leia apenas literatura. Talvez um dia eu escreva a sério, em vez de andar a brincar aos posts. Talvez um dia deixe de ser velho em corpo novo e seja novo em corpo velho. Talvez um dia me possa sentir a voar nos meus sapatapos e não me arraste. E talvez, só TALVEZ, um dia eu ganhe coragem.

1 comentário:

Anónimo disse...

Sei que meio de tantos “talvezes” existirá muitas certezas. Cabe-te a ti transforma-los.

“Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.”
Fernando Pessoa