«o que me excita a escrever é o desejo de me esclarecer na posse disto que conto, o desejo de perseguir o alarme que me violentou e ver-me através dele e vê-lo de novo em mim, revelá-lo na própria posse, que é recuperá-lo pela evidência da arte. Escrevo para ser, escrevo para segurar nas minhas mãos inábeis o que fulgurou e morreu.»

Vergílio Ferreira, Aparição

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segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Queda presa

Quedo-me na queda do dia para um dia. Quedo-me na queda de mim para o Manuel Bruschy Martins. Quedo-me na queda da fé para a esperança, e da esperança para a acomodação e da acomodação para... bem, sabem, para a perda de mim. Porque este dia é só mais um dia; porque Eu sou apenas uma pessoa que trabalha e convive, cuja essência não se revela, cujos momentos não são de vivência, mas de sobrevivência (palavra mais absurda: não será a sobrevivência uma autêntica sobvivência?); porque não tenho tempo e vontade de crer com todas as forças do meu ser, porque me acomodo, porque sentado deste trono terreno que é a cadeira à secretária a perspectiva do Mundo é um ecrã povoado de pixeis onde muito há para ver, mas pouco que me permita aí estando, estar sendo.
Visito o meu blog na esperança de me revisitar, mas é já tarde, não na hora, mas na rotina, e estou perdido de mim. O Mundo é, aqui e agora, não o lugar onde sou, mas um lugar onde estou.
Oh!, que eu ainda exista, é tão certo quanto hoje não ser ontem, mas que eu não saiba de mim, porque o labirinto que na vida vou criando é tão grande que me distancia enormemente daquilo que coloquei por trás de barreiras verdes como sebes, mas inertes e avassaladoras para o caminho, é apenas resultado de ontem não ser hoje, e de amanhã não ser mais que uma vaga promessa de replay.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Talvez um dia...

Talvez um dia eu passe a gostar mais do meu trabalho. Talvez um dia eu bata com a porta. Talvez um dia eu pegue numa mochila e parta sabe Deus para onde, para me descobrir. Talvez um dia eu deixe de ser (mais uma) engrenagem das máquinas do capitalismo e me dedique a causas em que acredite. Talvez um dia eu te vá procurar e deixe de esperar que me caias do céu. Talvez um dia a chuva caia e a minha preocupação não seja o trânsito. Talvez um dia eu deixe de ser um desarrumado mental. Talvez um dia eu saiba o que quero. Talvez um dia eu faça o que quero. Talvez um dia arrisque e aja despreocupadamente com a X, a Y, a Z e demais pessoas necessárias revelando interesse (talvez assim te encontre). Talvez um dia diga à minha mãe o quanto gosto dela. Talvez um dia diga ao meu pai o quanto o respeito. Talvez um dia diga aos meus irmãos tudo o que me ajudaria ter ouvido. Talvez um dia eu diga a certas pessoas para irem à fava. Talvez um dia eu faça longos pedidos de desculpas. Talvez um dia eu me esqueça do que é um computador. Talvez um dia eu leia apenas literatura. Talvez um dia eu escreva a sério, em vez de andar a brincar aos posts. Talvez um dia deixe de ser velho em corpo novo e seja novo em corpo velho. Talvez um dia me possa sentir a voar nos meus sapatapos e não me arraste. E talvez, só TALVEZ, um dia eu ganhe coragem.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

"Heart Skipped a Beat", dos The Xx

da busca de ti I

E tentar encontrar-me, sabendo-me ainda desesperado por te encontrar e por te ter. Farejo-me o rasto, mas perco-me, distraído pelo odor intenso e ainda tão confuso de ti. Dou por mim seguindo as brisas, na esperança de que alguma me leve até ti e, sem rumo certo, sabendo apenas que te tento alcançar sem saber do teu paradeiro, sem saber quem és, sem me surgires como o cheiro nítido de uma rosa ou de uma camélia, mas antes como uma mistura indistinta, embora indiscreta na sua incognitude, sem saber, sem ver, sem ouvir, sem cheirar, eu sei-me já entrado na escuridão da noite perscrutando o céu estrelado à procura de alguma orientação até ti. E é neste estado que espero que a noite me traga de volta o sono que levaste contigo para essa terra de nenhures onde o mundo te camufla e te esconde de mim.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

.......................................dias que passam e nada muda.
................vezes e vezes sem conta a mesma desilusão.
.de orgulho, sempre pouco.
......................de compreensão, quase nada.
.......................................perco-me da essência deste quase nada.
..............escassa esperança que me custa alimentar.
................................ela não morre, porém.
......morresse antes, e tudo seria apenas o mórbido silêncio do arrependimento.
A noite. Longa. Silenciosa. No gemido de uma acutilante calma jaz o grito do ipiranga de um ser que se vê no espelho como um belo adormecido. Ele é calmo, é cortês, é bem parecido. É inteligente, sorri com todo o encanto da simpatia e é, profissionalmente, bem conseguido. Tem-se a si como um promissor investimento, mas é ainda inóquo. Juram-lhe que tudo renderá, que a espera renderá. Mas na pressa de um retorno, na insatisfação da vigia, os juros não rendem, Ainda.
(é com pontos - finais ou interlocutórios - que dá de si, a si, essa pausa.)
Cada ponto é ainda uma espera. E com cada ponto ele espera pôr toda a impaciência em espera. Mais: ele espera vencer-se, não de cansaço, mas de paz. É o que lhe apraz e pronto. .r.... Que se engane, ainda. .r.... Que se iluda, já. .r.... Pudera ele esvair-se na noite como um som que ninguém escuta nos seus sonos e nenhuma inepta insónia traria de volta ao mundo o ser que seria tão-somente o ruído sem sombra nem bagagem de uma noite fresca. E esse ruído seria, na humilde pequenez do desconhecimento do mundo, um fim em si mesmo. E os outros sons, os que ecoam nalgum campo de squash craniano que ele quis esquecer de revisitar, sem sucesso, seriam apenas o pó que uns sacodem da capota e que outros comem porque nada mais lhes pára na boca. É do sonho, o que ameaça chegar mas que .r...., sempre pode virar pesadelo, que ele tem medo. Não que o afaste das terras-do-nunca (do nunca mais é real, diria), porque ele é no sonho. É no sonho que ele se encontra e que ele se constrói.
Ele é um sonhador, e sonha tão completamente que até sonha que é dor, a dor que deveras sente.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Tu?

Estou preso a uma ideia, a um fantasma que não se corporiza. Quero soltar-me deste desejo que me consome por não cumprido, que se força à realização e que se quebra num caco. Que, em desespero, me quebra. Em desespero espero, ainda como sempre, esperando não mais esperar. E na espera, há um vulto, vestido de ti, que me acena do longínquo amanhã, incerto.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

(h)ora(s) (que) são

horas que nascem, horas que morrem, horas que passam. hora das coisas que cansam, ora das coisas que doem, hora das coisas que matam.
ora aqui, ora ali, ora acoli, ora acolá. ora, nesta hora ele ora, ora agora, ora já.
ora ainda, ainda é hora. hora após hora, ora, ele ora.
ora a toda hora, ora chora, ora ora para não chorar mais agora. ora são, ora triste, e neste momento resiste à hora de agora e por ora ele ora, sem demora.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Trabalha. Faz. Dá de si. Dá por um preço. Dá gratuitamente. Espera receber e quase morre da espera. Exausta-se-lhe o dia e descansar é tudo quanto quer. Mas descansar é tudo quanto não consegue, porque não há paz. Perdeu-se. Perdeu-se e não sabe mais de si quando a porta se fecha atrás de si e se dá conta que mais um dia se foi, com ele uma semana, com esta um mês e com este último um ano. Dá-se conta de que há um vazio durante o dia proporcional à cidade cheia de gente e de que quando a noite chega o vazio equivale à solidão com a qual se depara no confronto com a consciência. Tem medo do espelho: o espelho é o quebrar da ilusão que é estar frente às gentes com as quais se cruza lançando sorrisos, qual protagonista, realizador e argumentista da própria vida. Tem vergonha do escuro, porque no escuro as vozes que lhe gritam por de dentro da pele ganham a força de bestas. E pede. Pede perdão. Pede esperança. Pede que o ajudem a trepar e a tapar o buraco em que se encontra. Pede, por fim, que o sono vença a batalha do desassossego.
E no dia seguinte, mal disfarçando as olheiras, reencena, reinterpreta e reescreve.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

E, bem assim, ...

Pergunto-me se estou bem assim. Assim, assim. Procuro-te enquanto te espero, assim. Espero procurar-te e procuro esperar-te. E enquanto assim espero, enquanto nada és, és tudo. Porque de tudo és ainda nada. E de quanto preciso, isso o tens. De quanto o tens, disso preciso. Do que és, isso o busco e do que buscas, isso o sou. E é por isso que, assim, a distância do tempo de hoje para o tempo de ti é tudo quanto virás a ser quando a distância do tempo de ti para o tempo de hoje nada for.

Assim, assim

Nem sim, nem não. Assim, assim. Assim a resposta certa à pergunta «Tudo bem?». Assim mo questionam; e a resposta que lhes não importa, não sendo esta, pouco os incomoda. De pouco serve ser essa ou outra, porque em verdade, em verdade vos digo, é só mais uma frase da praxe, como a resposta lançada é só mais um dos automatismos assimilados. Que mais responder? É assim. Que mais perguntar? Melhor será assim. Que mais ouvir em resposta, senão assim, assim como quem meio ouve, já ouvido que estava o que esperava ouvir e mais que não fosse ouvido por mais se não querer gastar com mera convenção vã. E que mais querer, quando é assim, quando o fácil se assimila e se dá a mostrar ao mundo em todo o seu esplendor de ovo dourado e sem vida? Porquê querer alcançar mais, esperar mais de mim, do mundo? Porque sou assim. Assim, assim de diabrete, de anjinho, de salvador e de salvo, de alegre e de melancólico, de esforçado e de calão. Assim? Sim, assim, assim.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Nada como a tristeza dá mais razão de ser à obra de um artista. Ela é a musa inspiradora suprema e mais sublime. Não que não haja grande riqueza na alegria, na felicidade. Há-la, porventura, em maior escala, mas o gozo dos momentos alegres dá-nos mais ânimo e vontade de viver, de experienciar, de ser, em essência. No sofrimento não correm pernas, sorrisos ou empreitadas, mas corre a pena pela alma. Corre a pena quando não correm as lágrimas, as zangas, os desvarios ou os simples amuos. Mas como prefiro o correr da tinta, ou o correr de teclas, à dor extrema da angústia vivida na primeira pessoa, é num terceiro ser, o do escritor que me mim vive, que tudo corre e em que, por fim,. tudo repousa, para que nas minhas pernas restem forças para me erguer e continuar a caminhar, corajosamente.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Um pouco de arte, por favor, um pouco de arte

Um pouco de arte, por favor, um pouco de arte.

Eu no meu carro, enquanto a minha mente divaga

Quero fugir de mim, daqui, do tempo. Quero pensar, sentir e ser mais que um corpo preso no tempo, preso pela gravidade, gravitando em torno de mim, girando pelas ruas, metido no meio de todos, sozinho sem contar com nenhum(a) roteiro (ajuda, companhia)

Na solidão de uma noite escura e quase fria

Quero um guião, para dele escapar. Ir para além do que me é oferecido, mas ter um ponto de partida, uma referência: uma página, um acorde, um tom de verde perdido na palete, um minuto da bobine, uma coreografia que não esta modernice divina do vai-se vendo enquanto se segue, uma textura mais que o ar,

Que me bate no rosto e me fustiga o agora e me traz um cheiro a sonhos, entrando de manso pela janela aberta, seguindo a alta rotação, acompanhando o motor

Um flash,

Never back, but forward, as the road

Um sorriso, fingido meu, nas expressões de um elenco

De coisas pelas quais passo, mas às quais não me apego. Só sigo, pela estrada

"Da vida..." seria um bom título para uma crónica, não fosse A vida.

E eu aqui. E eu ali há pouco. Só sigo. Só guio.

Um pouco de guerra mais nesta batalha. É um batalhão de estados que me toma. Uma tempestade mental para me permitir a paz do reencontro comigo mesmo no cuidar das mazelas. Quero-o. Tenho-o porque o quero. Quero-o porque tenho esta mente voraz que não pára, não quer parar, quer-me consumir a mim mesmo, a MIM, até que as cinzas restantes mais não sejam que uma ténue mistura de mim nalgo que espero ser uma semente da minha essência, prontas para fertilizar a minha marca no Caos. Sim, é no caos que nasce a luz, é no caos que nasce o cosmos. É aí que nasço, aí de onde quero fugir, até aos primórdios da essência.

Passo as luzes, passo as casas. Não passo por elas. Passo-as. Ultrapasso-as, como se não mais fossem parte da paisagem que contemplando vou, mas da estrada.

É loucura.. É loucura?

Sou eu!

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

algures em agosto

Um pôr-do-sol abrasado pelo canto de grilos, uma juventude repleta de incertezas longínquas e uma pausa reconfortante do mundo num momento de isolamento querido, numa cidade distante dos dias comuns. Férias das próprias férias, da família, dos amigos, dos estranhos e desconhecidos. Antes de o mundo voltar à carga ganho tempo para mim mesmo e reconquisto fronteiras onde me governar, que a batalha ainda me surge longa e antes dos augúrios de Setembro há que recuperar as forças. Aqui. Eu. O futuro suspenso. Presente, só o presente.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

quase meio ano depois de...

...
Dias
e
Mais dias
,
Eu
e
O Dia
-a-dia
Consumindo
os
Meus passos
os
Meus gestos
os
Meus momentos
e
Eu
no
Dia
-a-dia
Passando
e
Procurando Estar
e
Ser
e
Deixar
de
Mim
algo
Mais
que
Marcas
no
Chão
que
Piso
mas
Descurando
a
Introespecção
a
Reflexão
a
Partilha
e
A Escrita
.

Hoje volto a escrever para não deixar escapar este meu espaço de intro-expansão.